Encruzilhada.


 


         Certa noite sonhei estar em um salão, rodeada de pessoas desconhecidas, vestidas de branco. Havia homens com suas cabeças cobertas por mantos brancos, exibindo barbas brancas e longas e eu estava sentada com dois rapazes. Havia um à minha esquerda, outro à minha direita. Em meu âmago a minha expectativa era beijar aquele rapaz que me acompanharia pela vida. Na minha mente do sonho, naquele instante me parecia óbvio que o escolhido seria o rapaz da esquerda por ele meu desejo estava preenchido naquele instante, mas qual não foi minha surpresa quando fora de meu controle algo me moveu para a direita e eu beijei aquele. No mesmo instante o rapaz da esquerda desapareceu e eu acordei.

Daquela noite já se passaram três anos e eu ainda não sei quem são os dois rapazes dentre os quais teria de escolher, mas hoje olho aqueles rapazes de aparência tão parecida no sonho e os comparo à caminhos que posso tomar em uma encruzilhada.
O que é o caminho da esquerda e o que é o caminho da direita?
Em se tratando de cabala e pensando na árvore da vida a intepretação que obtive até hoje é de que quando escolhemos o caminho da direita permitimos que a luz nos guie por nossa missão de vida, não importa a dificuldade, faremos o máximo para cumprir com esta missão em uma decisão consciente a qual abraçamos.
 Quando escolhemos o caminho da esquerda não nos permitimos ser guiados por esta força maior, que por ora chamamos simplesmente de “luz”, e há motivos diversos conscientes e inconscientes que nos fazem buscarmos incessantemente aquilo que desejamos, nem sempre buscas relacionadas com a nossa missão de vida, mas muitas vezes algo que nos preenche mais rapidamente e torna nossa vida mais agradável momentaneamente, muitas vezes de forma reativa.
Quando há um vazio é natural que desejemos preenche-lo com rapidez. Não importa o nome do seu vazio é instintivo que você busque aquilo que preencherá seu buraco interno: amor, sexo, conforto material, conhecimento, sabedoria, reconhecimento.
Justamente por vivermos neste mundo do conhecimento da árvore do bem e do mal é que nossas escolhas são essa mistura que ora é direita, ora é esquerda, ora é bom, ora é mau. Somente o advento da imortalidade como o Rav Berg tanto fala em seus ensinamentos eliminaria o caos e o sofrimento do mundo poderia nos permitir recuperar essa conexão permanente com o que é bom e apenas bom ou seja, apenas com a árvore da vida.
Mas para atingirmos isso precisamos mudar nossa essência em nível de consciência, e falo daquela que cultivamos no dia-a-dia. Estamos sempre muito focados em pequenas coisas que dizem respeito a nossos pequenos confortos imediatos e nos permitimos ignorar coisas mais importantes ao nosso redor. Quando for uma verdade interna absoluta que o outro faz parte de mim, teremos removido o espaço entre as pessoas, aquele que o Rav chama de causa principal do caos em seu livro Nano que no meu parco entendimento geraria um intenso sentimento de união entre todos os seres humanos. Penso que deve ser alucinante poder ver-se nos olhos do outro. Penso também que seria uma experiência transformadora tão intensa que seria impossível não amar o outro como a si mesmo.
Enquanto isso não ocorre vivemos divididos entre as consequências das escolhas do passado e nossos próximos passos. Não podemos dizer de imediato o resultado de qualquer uma delas pois temos o benefício do julgamento adoçado. As consequências de nossas escolhas se perdem no tempo em um emaranhado de fios que não nos permitem desembaraçar da causa da consequência devido a distância entre ambas. Ainda precisamos ser gratos por isso, desta forma temos algum tempo para reverter algumas consequências desagradáveis se tivermos a sorte de realizar para onde estamos sendo conduzidos naquele caminho que tomamos em nossas decisões.
Livre arbítrio consiste justamente nisso: conhecer a opção da esquerda e a opção da direita, ainda assim desejar o caminho da direita, por mais duro que seja momentaneamente. À direita teremos conforto a longo prazo, após um período de trabalho duro, à esquerda teremos o conforto imediato, mas provavelmente pouco duradouro. Onde você prefere o seu desafio?
Perceber as consequências da escolha de forma consciente e lúcida, era o que o Rav Ashlag chamava de dupla revelação. É certamente privilégio de poucos estudiosos. O curioso é que até poderemos imaginar algumas consequências de nossas decisões no momento em que as tomamos, mas quando estamos em ocultamento o resultado sempre será diferente daquilo que imaginamos ou que planejamos dependendo do grau de controle que almejamos ter sobre as nossas próprias vidas.

Infelizmente seguimos classificando as escolhas pelas consequências na maior parte do tempo e por isso, como Jobs dizia, a vida só faz sentido se vista de seu último instante em direção ao primeiro por que ainda temos a sorte de ser reconduzidos pela misericórdia da luz mesmo quando nos sentimos mais perdidos em períodos de forte julgamento em nossas vidas.    
Ter a paciência de não classificar os acontecimentos assim que acabam de ocorrer ainda é uma bênção pois somente assim poderemos ver a beleza da figura completa que é a vida, esse livro que só faz sentido se lermos do final em direção ao começo.

Créditos da foto: Meu querido amigo e companheiro de pedal Gustavo Fuchs. 
Créditos do vídeo: Infinita Highway - Engenheiros do hawaii -  Gessinger é um mágico das palavras, o que eu tento falar em prosa de forma séria ele já teve o brilhantismo de escrever em verso há quase 30 anos e assim sigo almejando a alquimia dele nas letras...
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