Por que anti-heróis me fascinam?
Quando penso nas histórias
de ficção já escritas e contadas além da forma como nossa história enquanto
humanidade é contada me deparo com uma pergunta simples: é possível que exista
um representante do absoluto bem e outro do absoluto mal? Nosso mundo pode
mesmo ser retratado desta forma, como uma constante luta entre dois opostos extremos? O
mundo é pintado em preto e branco?
É possível que um vilão seja
mau com as pessoas que ele ama? Enquanto líder ele tem seguidores, mas com
estes ele não representaria um ideal a ser atingido?
Anti-heróis me fascinam
justamente por isso. Falamos de pessoas comuns com atitudes que exaltam seus
aspectos negativos, mas estes não ofuscam a percepção delas em relação ao que
consideram correto, moral a ser feito.
Anti-heróis me fascinam por
que são honestos. Eles não nos despertam expectativas. Eles não são obrigados a
serem os mocinhos da história. Eles têm traços comuns, que qualquer pobre
mortal carrega em si: medo, raiva, egoísmo, egocentrismo, vaidade, rabugice,
solidão, auto isolamento...
Um anti-herói não tem
obrigação nenhuma de fazer o bem ou o correto a ser feito na história, ele simplesmente
o faz pois precisava ser feito, ele decidiu fazê-lo e eventualmente abusa, quando
em cena, se utilizando de um certo charme de quem faz o bem à contragosto,
relutante.
Anti-heróis são adoráveis
justamente por isso, toda ação é completamente sua, autêntica, vinda de sua essência.
Não há forças externas que os governam por culpa ou por dever. As coisas são o
que são ponto. Não há deuses ou demônios que lhes governam, há seres humanos e decisões a serem
tomadas, ações a serem executadas. Não sem um benefício próprio em algumas
situações, mas o egoísmo é uma qualidade tão humana.
Não posso eliminar o brilho
no olhar angelical de um mocinho, mas ele já é naturalmente bom então, em que
se superará? Como ele vencerá a própria natureza e tornará chumbo em ouro? Onde está o desafio do mocinho em sua vida? Se nele já há uma tendência
natural em buscar o bem, em agir com moral e ética.
Mas o quanto é real que se cultive a atitude de mocinho 24 horas por dia? O
mocinho não tem nenhum ponto escuro a esconder em algum lugar ermo dentro de si,
do qual se envergonha, em silencio consigo mesmo? Naturalmente, se for humano
sim e provavelmente muito mais do que gostaria.
Transferindo essa ideia de
um personagem, para uma personalidade real da nossa história relativamente recente:
Winston Churchil. O primeiro ministro inglês que foi peça fundamental para que
os aliados vencessem a segunda guerra mundial, foi estrategista brilhante, se
dedicou à salvar inúmeras vidas através de seu trabalho. As tendências de se
auto destruir através do uso abusivo do álcool não lhe tiram o mérito das
boas ações durante a guerra, eventualmente poderíam ilustrar um quadro
dramático de algum conflito interno doloroso, marcando uma tendência ao
escapismo, tão humano quanto o de qualquer soldado na trincheira.
A
tendência natural dos humanos em buscarem os ares da divina perfeição para seus
heróis, esta sim deveria ser combatida. Quando pintamos humanos de santos lhe
tiramos a dimensão humana de viver neste planeta conturbado e complexo. Tirar
os defeitos dos heróis é tirar a misericórdia dos olhos para com qualquer
mortal. É julgar e condenar atitudes que são parte do ser humano.
Cultivar o
uso dos anti-heróis nos romances é distribuir novos olhos, adoçar corações e
enxugar lágrimas.
Se você
tirar o mal que você reconhece em seus inimigos e o bem de que se beneficia em
seus amigos, como você os diferenciaria? Se o inimigo perde o prefixo e se
confunde com o seus amigos, talvez você veja de si mais nele do que imagina. Haveria motivo de violência no mundo se conseguissemos ver a figura completa da vida daqueles que rotulamos como "vilões"?
O bem e o
mal, quando são encarados como absolutos, quando deixam de ser perfeitos e exatos
tornam disputas estupidas. Colocam os vilões e os mocinhos no mesmo patamar,
dariam vida à condenamos à morte e condenaríam pessoas livres à prisão. Você teria coragem de ver a figura completa por detrás de alguém que fez algo que você considera imperdoável?
Talvez o desafio do mocinho seja superar a própria dor quando o mal lhe bate a porta para poder ajudar outro a transformar escuridão em luz e ter certeza de que John, Paul, Ringo e George estavam certos naquela canção que eles fizeram em 1969 sobre o que a humanidade de fato precisa...
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